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Gean Ramos

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Fé na vida

BASEADO EM UMA HISTÓRIA REAL

Fé pela vida

O avô da Raíssa era uma pessoa de fé. Fé pela vida, fé pelas pessoas que ele amava, fé pela força do trabalho honesto e uma fé inquestionável por Nossa Senhora Aparecida.

  • Ela nunca conheceu alguém tão devoto e afirma com convicção que aprendeu a ter fé com ele.

Cresceu ouvindo histórias das suas romarias a cavalo e a pé para Aparecida do Norte. Viveu rodeada pelas festas cheias de tradição em seu sítio e até aprendeu algumas orações em latim.

Em suas palavras, seu avô era realmente um relicário inteiro do significado de amor. Mais especificamente falando, do seu amor.

A Raíssa lembra de sempre arrumar motivos para dormir com seus avós aos finais de semana. Ela arrumava motivos só pra chegar na casa deles — e ver o seu avô aguardando na varanda.

  • Ela também se lembra das inúmeras vezes em que acordou no meio da noite e pediu colo depois de um pesadelo.

Recorda das tardes inteiras que eles passavam no quintal, que era um cenário de encontros e despedidas.

Lembra de ouvir os casos do seu avô, se divertir com suas histórias ou aprender com seus conselhos. Lembra também de simplesmente viver o aconchego do silêncio que era só dos dois.

A Raíssa contava da sua vida, fazia piada e tentava arrancar um sorriso do seu avô. Ela sempre falava que o amava, e recebia de volta um: “eu também, meu coraçãozinho”.

  • Na benção de cada despedida, ele desejava pra ela um “boas mentes” porque sabia que não existe bem mais valioso do que o nosso pensamento.

E ele odiava tanto despedidas que sempre ficava na varanda vendo os netos irem embora de carro. A Raíssa também tinha dificuldade com o “adeus”, e vivia pela ânsia do reencontro.

Usando as palavras de Annie Ernaux, ela diz que foi ignorando “o tempo passando por ela”, negligenciando a possibilidade da ausência.

Mas esse tempo se congelou em uma tarde no consultório médico. Seu avô descobriu um câncer maligno raro, e ela rezou e pediu para o tempo continuar congelado.

  • Mas o tempo não ajudou. Em pouquíssimos meses — no dia de Nossa Senhora Aparecida —, seu avô descansou.

Não foi fácil. A Raíssa se fechou em seu silêncio. Queria que o tempo acelerasse e, por muitos meses, não conversou sobre o barulho estrondoso que era a ausência do seu avô.

Agora, chegou o mês do aniversário dele, e ela decidiu celebrar esse relicário de memórias que ele deixou dentro dela. Celebrar essa ligação que só pode ser de outras vidas.

A Raíssa continua sentindo a ausência do seu avô todos os dias. Hoje, a falta não faz mais tanto barulho quanto antes, mas ela continua fechando os olhos e pedindo a benção.

  • Ela queria que o seu avô soubesse que, a cada dia, ela tenta se tornar mais forte e corajosa. E que se lembra dele quando vê girassóis.

Ela também queria deixá-lo tranquilo, garantindo que cuida muito bem da vovó. E queria agradecê-lo pelo desejo diário de “boas mentes”.

Por ter convivido com seu avô, ela carrega a certeza de que estará sempre abençoada. Se a “nossa mente é o nosso lar”, o lar da Raíssa está repleto de memórias lindíssimas.